Palavras...

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sexta-feira, 7 de abril de 2017

OS MAIAS de Eça de Queirós (em 1001 Livros para Ler Antes de Morrer).

"Eu poderia dizer que, ao fim e ao cabo, OS MAIAS são um romance sobre o espaço, onde a "geografia" de um país, de uma cidade, mas também de várias casas e de muitos corpos é percorrida pelo olhar atento de um narrador que nunca duvidou de que era por detrás das superfícies que as verdades se escondiam." (Monica Figueiredo)

Entrada de OS MAIAS em 1001 para Ler Antes de Morrer

"A casa que os Maias vieram habitar em Lisboa no outono de 1875 era conhecida na vizinhança da rua de São Francisco de Paula, e em todo o bairro das Janelas Verdes, pela Casa do Ramalhete, ou simplesmente o Ramalhete." (p.7)

Zahar, 574 páginas

"Obra máxima de Eça de Queirós, marco da literatura portuguesa, OS MAIAS envolve o leitor na irresistível atmosfera de Lisboa de fins do século XIX. Tendo como protagonistas Afonso, Pedro e Carlos Eduardo da Maia, e apresentando outros personagens memoráveis, como João da Ega, Dâmaso Salcede, Maria Eduarda e o casal Gouvarinho, narra a trajetória de uma família, a história de uma amor impossível e os rumos de um país. Eça dá vida a um refinado jogo social e compõe um panorama da cultura e dos problemas sociais e políticos do seu tempo, numa prosa limpa, cortante e inigualável."
...

OS MAIAS é uma história que, desde o primeiro contato em 1994 (sim, eu lembro o ano), não saiu mais de minha vida. O livro me tocou de modo tão marcante que, durante as semanas seguintes àquela primeira leitura, não saia da minha cabeça. Foi a minha terceira experiência com o escritor, antecedida pelos indefectíveis O CRIME DO PADRE AMARO e O PRIMO BASÍLIO

Eça de Queirós me deixou abismada nas leituras anteriores, porém, o que senti com OS MAIAS foi algo tão peculiar que, aos 21 anos, eu não sabia como definir.

Em 2001 saiu aqui no Brasil uma belíssima adaptação televisiva. Esta dramatização apresenta algumas diferenças em relação ao texto original, todavia, considero que a essência e - mais importante - o espírito da história foi capturado e transmitido brilhantemente. Quando a série chegou ao fim, após semanas me arrancando lagrimas copiosas, eu reli alguns trechos do livro. OS MAIAS  colaram de vez em minha alma. 

Livro, trilha sonora, DVD e, hoje em dia, tudo que posso encontrar na internet sobre o tema, me atraem e eu vou - feito mariposa para luz - ler, ouvir, assistir de novo, e de novo, e de novo...

Foi inevitável adquirir esta edição lançada pela Zahar em 2014.


Contra-capa e folha de rosto

Chego ao final de uma nova leitura (completa) com a alma transbordando de Afonso, Maria Eduarda, Carlos, Pedro, Maria Monforte, Ega, Rosicler... 

E hoje, aos 44 anos, consigo entender, um pouco melhor, as sensações tão difíceis de nomear, e que resultaram naquele primeiro nó de garganta vivido em 1994.

Empatia profunda com um texto. Desgosto pelos personagens vencidos, quando tinham tudo para serem vencedores. Tristeza diante das tragédias sofridas. Deslumbramento por testemunhar a potência literária de um autor.

- Ainda agora, escrevendo estas impressões, minha garganta dói, e meus olhos se enchem.

...


Mas, para não deixar a impressão de que OS MAIAS é tão somente "um romance do desencanto", afirmo que dei muita risada com a ironia de Eça de Queirós

Como prova, deixo aqui uma lista de algumas das melhores frases que encontramos pelo caminho.



"Num país em que a ocupação geral é estar doente, o maior serviço patriótico é incontestavelmente saber curar." (p.73)

- Enfim - exclamou o Ega - se não aparecem mulheres, importam-se, que é em Portugal para tudo recurso natural. Aqui importa-se tudo. Leis, ideias, filosofias, teorias, assuntos, estéticas, ciências, estilo, indústrias, modas, maneiras, pilhérias, tudo nos vem em caixotes pelo paquete. A civilização custa-nos caríssima, com os direitos da Alfândega: e é de segunda mão, não foi feita para nós, fica-nos curta nas mangas..." (p.91)

 "Carlos achava deliciosa aquela naturalidade mefistotélica com que o Ega o induzia a quebrar uma infinidade de leis religiosas, morais, sociais, domésticas..." (p.159)

"- Acredite você uma coisa, Craft - terminou ele por dizer, cedendo ao Taveira, que o puxava para a mesa - isto de consciência é uma questão de educação. Adquire-se como as boas maneiras; sofrer em silêncio por ter traído um amigo, aprende-se exatamente como se aprende a não meter a mão no nariz. Questão de educação... No resto da gente é apenas  medo da cadeia, ou da bengala..." (p.174)

 "Uma das senhoras de preto fazia votos para que se aliviassem os estudos. As pobres crianças sucumbiam verdadeiramente à quantidade exagerada de matérias , de coisas a decorar: o dela, o Joãozinho, andava tão pálido e tão desfigurado, que ela às vezes tinha vontade de o deixar ficar ignorante de todo." (p.234)   

"Tudo na terra, meu Dâmaso, é aparência e engano."(p.298) 

"- Pois então façam vocês essa revolução. Mas pelo amor de Deus, façam alguma coisa!" (p.302)

"- Essa necessidade de banhos morais está-se tornando, com efeito, tão frequente... Devia haver na cidade um estabelecimento para eles. (p.379) 

"Mas Ega entendia que que o Sr. Afonso da Maia devia descer à arena, lançar também a palavra do seu saber e da sua experiência. Então o velho riu. O quê! Compor prosa, ele, que hesitava para traçar uma carta ao feitor? De resto, o que teria a dizer ao seu país, como fruto da sua experiência, reduzia-se pobremente a três conselhos, em três frases - aos políticos: "menos liberalismo e mais caráter"; aos homens de letra: "menos eloquência e mais ideia"; ao cidadão em geral: "menos progresso e mais moral". (p.439)  

"Falhamos a vida, menino!" (p.549) 






PS: A edição da Zahar é muito boa, apesar de uma pouco pesada. Prestem atenção no posfácio de Monica Figueiredo.



Um beijo e ótimas leituras.